Monday, April 04, 2005

Aliterações, Dissonâncias e Uma Pequena Transgressão Amarela

São Paulo é uma cidade feia. Quanto a isso não restam dúvidas. Vinícius que me perdoe, mas não sou desses cariocas que acham que o pior de São Paulo é que por mais que você ande nunca chega a Ipanema.

Pelo contrário. Adoro São Paulo e todo aquele caos. Tenho uma teoria sobre cidades que nunca escrevi nem nunca escreverei, mas São Paulo se aplica bem no quesito cidades interessantes. Mais ou menos como na Alemanha - de quê adianta toda a beleza e limpeza e alegria e cervejas de Munique se em Berlin é maior bagunça? Daí que Berlin é a cidade mais legal da Alemanha. Mas digressiono, com diria um amigo meu.

Chegando a São Paulo já é possível sentir todo o drama e beleza que cercam a cidade. A chegada, pela Marginal tietê, é de uma feiúra impressionante. Aquele rio podre cercado de prédios feios e decadentes. Mas ao pegar um metrô, quase meia-noite, totalmente lotado, a sensação era de felicidade. Uma cidade que acontece.

O metrô de lá é dos mais interessantes. O do Rio é bonitinho, limpinho, bem frequentado, não vai a lugar nenhum. Em São Paulo o metrô é maior, mais bagunçado, mais rápido, mais feio - o que chamaria de metrô pragmático. É frequentado por todos os tipos, do punk ao pastor evangélico, do universitário ao mendigo, um pequeno retrato da pluralidade da cidade.

O melhor jeito para se conhecer uma cidade é pelo transporte público e a pé - se possível, ambos combinados. E um passeio de 8 horas e alguns muitos quilometros me mostrou uma São Paulo que não conhecia, uma cidade até mesmo bonita.

Todo mundo deve passar pela Oscar Freire num sábado ao redor de meio-dia. Uma multidão de paulistanos endinheirados passeando pelas lojas de grifes internacionais lotados de sacolas, com seus reluzentes carros importados tumultuando o trânsito. Bistrôs com mesas na calçada dão o charme a rua. Tudo lá parece combinar, nada é escolhido ao acaso. A maioria das pessoas se veste como manda o figurino tradicional, com suas camisas "despojadas" de 1000 reais e suas calças jeans de 500 reais. Alguns são transgressores, mas numa transgressão cuidadosamente preparada. Um tênis amarelo, combinando com uma camisa colorida com leves detalhes amarelos, uma calça aparentemente suja e maltratada - tudo parte do figurino cuidadosamente pensando para transgredir. Ali, a transgressão é de marca, combinante. Malcom MacDowell fazendo escola.

Apesar de toda a opulência, a cidade parece estar sempre querendo te mostrar quem é na verdade - a fiação suspensa, aquele emaranhado horroroso de fios, não nega o sangue latino-americano da cidade. Mais tarde enquanto caminhava pela Faria Lima deslumbrado pelas moderníssimas torres de escritórios topei com uma fonte de merda - merda jorrando de um buraco na rua, obrigando um Porsche a passar na contramão. O velho selo "vc está na América Latina".

Ali por perto há uma parte onde prédios imensos de figuras milionárias dominam o ambiente. É um lugar opressor, deveras opressor. Cada prédio ocupa praticamente um quarteirão, com muros gigantescos, cercas elétricas, e seguranças que te olham feio. Fiquei com medo, acho que não era digno financeiramente de estar ali. Mas mais pra frente cheguei na Rua Augusta e essa sensação se dissipou quando avistei o comércio caótico da rua, que tem inclusive a melhor loja de discos do mundo - Neto Discos. O cara assalta carregamento, ou adora perder dinheiro, não sei - a verdade é que os cds originais são baratíssimos. Onde comprar um The Man Who do Travis por 12 reais? Há uma teoria de que todo o lucro do cara vem da venda de cds dos Smiths, que são caros, mas há controvérsias.

A Avenida Paulista é bonita e tal, mas é mais legal a noite, ou melhor, de madrugada. Acho que poucos paulistanos já fizeram isso, mas caminhei por metade da extenção da Avenida as 3 da manhã bem bebado pelo canteiro central. Os prédios de bancos nunca foram tão bonitos.

E assim conheci melhor São Paulo, um lugar onde as pessoas não andam a pé, onde todo mundo parece se esconder atrás de um mundo de aparências, mas um lugar com uma beleza indescritível, bem particular, que acaba ressaltando as particularidades e individualidades. Mas isso fica pra outro post.

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