Obscured by Clouds
Comecei a chegar mais cedo no trabalho, o que implica, oh! obviedade, em pegar o metrô mais cedo. Isso me deixou triste pois perdi alguns amigos clássicos, como o Pedro Malan cover, o velhinho do iPod e até mesmo o careca do chapéu preto. Aliás, me lembrei que o Pedro Malan era um dos que liam Paul Auster, e o Pedro Malan é um lord que lê coisas boas. Deveria ter prestado mais atenção aos gostos de Pedro Malan. Mas agora, horário novo, vida matutina nova no transporte público. E com grande diferença. Meia hora mais cedo, o metrô carrega muito menos gente, é tudo tão tranquilo, vazio. E, apesar do pouco tempo, já começo a fazer novos amigos virtuais, e até mesmo uma paixão está surgindo. Trata-se de uma linda guria, cabelos claros, bem curtos, carinha de bebê, bochechas rosadas e tudo, e sempre um livro na mão. Desconfio que seja gringa, pois o livro é sempre daqueles pockets em inglês, de capas moles genéricas, que são difíceis de achar aqui e, bem, ninguém lê só aquilo no brasil. Da primeira vez que nos encontramos estávamos em pé, lado a lado, no vagão, eu com meu John Banville e ela com um Bernard Shaw. Ponto pra ela. Imaginei que fosse ponto pra mim também, eu sempre imagino isso, algo como ela ser irlandesa e pensar "god, he´s reading a banville, such a nice person he is", talvez ela queresse mesmo falar comigo, mas fingi não ver seu olhar. Agora, etamos nos encontrando todos os dias, trocamos alguns olhares, checamos qual o livro do momento - estou matando um Philip Roth enquanto ela se aventura por um Don DeLillo que não identifiquei ainda o nome (estilo ela tem!). Quando é um livro novo parece que necessitamos mostrar um pro outro, esperando um leve sinal de aprovação - certo, isso é legal, pode continuar lendo. Em meus desvaneios a vejo lendo um Pynchon, o que pode ser perigoso pois eu não resistiria e falaria com ela, quebrando a regra básica número 1 das paixões subterrâneas. Por enquanto, sigo procurando por ela todos os dias e - sim, por que não? - ela por mim, o rapaz que lê Banville, espere só até ela ver minha edição rara do Yeats, aquela linda irlandesa de bochechas rosadas não resistiria a um brasileiro lendo Yeats no metrô.
2 Comments:
Oficializo aqui a sugestão dada ontem no Hipódromo: leve para um metrô um livro igual ao dela (e não o mesmo livro, ou o Professor Pasquale vai encrencar). Serve, como second best, o mesmo autor. Se ela não falar com você mas sorrir lindamente e voltar à leitura, é a paixão platônica da sua vida, aquela de quem você vai se lembrar daqui a sessenta anos, enquanto estiver torcendo para cair uma bola no seu quintal.
Everybody loves an irish girl!!
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